terça-feira, 11 de junho de 2013

O PODER DO RAIO X


A prodigiosa técnica da fotografia através de corpos
opacos revoluciona a medicina; os resultados práticos na cura de
pacientes já são verificados na Europa e Estados Unidos
Uma descoberta espantosa: os ossos da mão de um paciente são fotografados pelo aparelho do alemão Röntgen (à dir.)

Poucas descobertas na história da ciência produziram resultados tão rápidos e surpreendentes quando a fotografia através dos corpos opacos, anunciada no final do ano passado pelo professor Wilhelm Conrad Röntgen, da Universidade de Würsburgo, na Alemanha. Desde que sua notícia ganhou as páginas dos jornais científicos, há algumas semanas, experimentos com o chamado "Raio X" – um misterioso e estranho elemento que não obedece às leis da reflexão nem da refração – vêm sendo conduzidos em diversos laboratórios da Europa e dos Estados Unidos. Agora o mundo se admira com os formidáveis relatos dos resultados de sua aplicação prática na medicina, mais notadamente na cirurgia. Atravessando a pele em direção à escuridão do âmago do corpo humano, os raios tornam visíveis detalhes que os médicos apenas podiam supor pelo exame subjetivo e por meio de deduções aproximadas. O fabuloso Raio X torna mais preciso o diagnóstico – e, com isso, aumenta a chance de cura das enfermidades que afligem os pacientes.
Onde tudo começou: o laboratório do inventor na Universidade de Wurzburg, Bavária
Na Inglaterra, a revista médicaLancet noticia o caso da cura de um marinheiro internado há vários meses no Guy’s Hospital, em Londres. O indivíduo, encontrado ébrio em um distrito da cidade, tinha paralisadas as extremidades superiores e inferiores. Os exames não revelaram nada além de uma chaga dorso-lombar, que logo se cicatrizou. Apesar da medicação, não houve evolução do estado do paciente. Chefe da equipe do hospital, o doutor Williamson teve então a idéia de fotografar, usando a técnica de Röntgen, a porção da coluna vertebral correspondente à ferida. O clichê revelou a presença de um objeto estranho nas cercanias da primeira vértebra lombar do marinheiro. Convocada a cirurgia, descobriu-se a lâmina de uma faca incrustada nos corpos vertebrais. O material foi extraído e o paciente apresenta sinais galopantes de recuperação. Em Viena, o doutor Mosetig tirou semelhante fotografia do pé de uma menina que padecia de uma deformação. A imagem manifestou em detalhes a extensão interna do mal, auxiliando-o na cirurgia subseqüente.
Repercussão: charge da revista 'Life'
O Raio X, na verdade, permite uma miríade de aplicações, que os médicos ao redor do globo estão rapidamente experimentando com êxito sem precedentes. O professor Neusser, ainda em Viena, fotografou uma pedra no fígado de um paciente, e outra na bexiga de outro enfermo. O professor Czemark, de Graz, fotografou um crânio vivo, sem carne ou cabelo, e já começou a adaptação da chapa ao estudo do cérebro. Em Paris, o doutor Lannelougue exibiu à academia de ciência local fotografias de ossos indicando tuberculose hereditária, que não fora revelada de outras formas. Em Berlim, não apenas ossos fraturados estão sendo fotografados, mas também fraturas já tratadas, para que seja possível ver com exatidão os resultados de sua recuperação. A capital alemã, por sinal, é um dos centros em que o uso do Raio X tem se alastrado mais rapidamente. Já se formou na cidade uma sociedade de quarenta médicos que buscam realizar e analisar pesquisas tanto sobre o caráter do elemento quanto sobre suas aplicações fisiológicas.
Como mágica: sapo e peixe fotografados
Só o começo – Descobertos por Röntgen em seu laboratório no Instituto de Física da Universidade de Würsburgo, em novembro passado, os Raios X são feixes invisíveis liberados quando uma alta corrente elétrica é fornecida dentro do chamado tubo de Crookes – um tubo de vidro esvaziado até ser produzida uma pressão muito baixa em seu interior. O cientista chegou ao resultado quando estudava o fenômeno da luminescência gerada por raios catódicos, descobertos por Hertz e Lenard há cerca de uma década. Ao usar um tubo de Crookes revestido com papel preto e um anteparo de papel pintado com platino-cianeto de bário – que detectaria a radiação emitida –, Röntgen descobriu que, ao elevar a tensão aplicada aos eletrodos do tubo, o anteparo ficava fluorescente. Semelhante efeito acontecia quando esse anteparo era recuado em alguns centímetros – o que não poderia ser provocado por raios catódicos. Ao posicionar alguns objetos entre o tubo e o anteparo, o alemão constatou que eram transparentes a essa radiação – em diferentes níveis, de acordo com sua composição. Por não saber exatamente qual a essência desses raios, resolveu denominá-los Raios X. Aclamado como responsável pelo avanço, o humilde Röntgen acredita que seus colegas deverão aprimorar ainda mais a técnica. "Este foi apenas o começo", avisou ele.

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