Os Coronéis
Com a República, os poderosos coronéis - que ostentavam esse título por concessão do Império que criou a Guarda Nacional - tomaram consciência da possibilidade de legalizar terras em grande escala. No Contestado não foi diferente. Passaram a receber concessões, a requerer e a ampliar seus domínios.
Com a chegada da Lumber, abriu-se a possibilidade de exploração e ganhos com as terras legalizadas, já que a poderosa madeireira não se limitou a explorar as imensas áreas que lhe foram concedidas e negociava com muitos proprietários.
Alguns coronéis, como Francisco de Albuquerque, de Curitibanos, e Fabrício Vieira, do Vale do Timbozinho, tornaram-se especialmente odiados pelos sertanejos que em muitas ocasiões pediram suas cabeças como condição básica para qualquer negociação de paz.
Afonso Camargo, vice-governador do Paraná, era um coronel à distância, mas igualmente odiado pois advogava para a grande madeireira - empresa em que mais tarde deu grandes golpes em negócios de terra. Poderosos, os coronéis tinham muitos afilhados. Durante a Guerra do Contestado viram-se pela primeira vez, no sertão, atacados mesmo por estes, tamanha a revolta dos sertanejos. Francisco Albuquerque, o primeiro, chamou tropas catarinenses para intimidar o monje José Maria e seus seguidores, foi morto após a guerra num declarado ato de vingança.
O Pós-Guerra
Encerrada oficialmente a intervenção do Exército em 1915, a Guerra do Contestado ainda teve continuação. Piquetes militares perseguiram focos revoltosos por muitos anos.
Os prisioneiros tinham destino variado. Muitos eram mortos imediatamente, outros eram reunidos e enviados para trabalho escravo muito poucos reintegraram-se às suas famílias ou voltaram às suas regiões de origem. O governo catarinense chegou a protestar pela intensiva migração forçada realizada pelo governo paranaense. Tropas federais permaneceram por algum tempo na região, a madeireira Lumber voltou a operar com desenvoltura, desmatando incessantemente. Os governos de Santa Catarina e do Paraná trataram de resolver suas pendengas e, em 1916, assinaram, no Rio de Janeiro, um tratado dividindo a área que pretendiam. O Paraná ficou com 20 mil quilômetros quadrados da área contestada e Santa Catarina com 28 mil quilômetros quadrados.
Os Sobreviventes
Nos anos de 1984/1985 um grupo de jornalistas realizou uma vasta pesquisa que resultou no documentário em vídeo chamado Contestado: A Guerra Desconhecida. Nesse período foram entrevistados os últimos sobreviventes da guerra. Homens ainda fortes, lúcidos, valiosos testemunhos de tantas lutas e horrores.
compreensão do conflito. Do lado dos vencidos, nenhum falava muito a vontade de combates e mortes. Temiam, mesmo depois de 70 anos, serem perseguidos pois os vencedores testemunharam que eles seriam fanáticos e criminosos mesmo assim, com calma e amizade acabaram fazendo importantes relatos para aDo lado dos vencedores nenhum orgulho especial pelo que fizeram, até pelo contrário. Deste lado foram ouvidos um ex-soldado e um ex-vaqueano. O primeiro mais instruído pode, depois da guerra, fazer uma reflexão que o levou a odiar ter sido usado para matar brasileiros como ele a serviço de “uma monstruosidade da administração”.
O vaqueano, que era pago por fazendeiros, contava atrocidades sem se gabar, mas com naturalidade.
Um outro depoente, que não combateu em nenhum dos lados mas acompanhou os acontecimentos, sonhava em se casar com “uma jaguncinha” (jagunço era então o nome dos revoltosos) e acabou fazendo-o.
As mulheres no Contestado
Rosa Pais de Farias, filha do líder Chico Ventura, fazia as bandeiras do movimento e os uniformes dos Pares de França. Morou e morreu em Lebon Régis, no meio-oeste catarinense.(Foto: Dario A. Prado Jr.)
Embora pouco reconhecidas pela literatura e registros da Guerra do Contestado, as mulheres tiveram um papel fundamental no conflito. Duas se destacaram na guerra por sua bravura: Maria Rosa, filha de Elias de Souza e Francisca Roberta, mais tarde conhecida como Chica Pelega.
Maria Rosa, aos 15 anos, em meio a orações, entrava em transe e discursava dizendo receber ordens do monge José Maria. Durante os transes tinha visões de batalhas e, daí em diante, era ela quem definia as ordens recebidas pelo espírito do monge para organizar o comportamento do grupo. Com o passar do tempo, além de líder espiritual, a virgem Maria Rosa se transforma em chefe militar e comandou a retirada estratégica, após a primeira batalha de Taquaruçú, em 1913, para o novo reduto em Caraguatá.
Chica Pelega, já respeitada em Taquaruçú por seu conhecimento e trato com ervas medicinais fica no reduto cuidando de doentes, velhos e crianças. Em 1914, as tropas do governo atacam novamente Taquaruçú onde ela luta bravamente.
Chica Pelega morre quando a igreja, tomada pelo fogo, desaba em cima do galpão onde se encontravam mais de 300 pessoas.
Rosa Paes de Farias, filha do grande líder Chico Ventura, foi uma das últimas sobreviventes da guerra e viveu até os 98 anos. Fazia as bandeiras de guerra e os uniformes dos Pares de França, tropa de elite dos revoltosos. Jamais se arrependeu da resistência. Afirmava: “Nós estávamos aqui e vieram nos atacar. O que havíamos de fazer? Resistir. Houve muita morte de lado a lado. Mas muito soldado passou para o nosso lado”.
O papel das mulheres menos conhecidas também foi fundamental. Enquanto os homens lutavam em várias frentes de combate elas cuidavam dos filhos, dos doentes e da obtenção e preparação de alimentos. Ao final da guerra foram tão humilhadas e maltratadas quanto seus maridos e filhos.
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