Joaquim José da Silva Xavier, o Tiradentes, militar, comerciante, topógrafo, dentista prático, praticante de terapias naturais, minerador, comerciante e ativista político não foi apenas a figura de barbas e camisolão que passou para a História.
Havia um homem por trás do mito - interessado na Revolução Norte Americana e impactado pelas idéias do Iluminismo. Foi um seguidor de Rousseau, Voltaire, Jefferson, Franklin e outros que se inspiravam em John Locke, autor de obras de filosofia política.
Este intelectual refinado, enforcado aos 46 anos, manteve longo caso com uma viúva, nunca se casou mas teve dois filhos: João e Joaquina.
TIRADENTES E CRISTO
Tiradentes foi figura histórica meio desconhecida até que os ideólogos positivistas, que apoiavam a República, redesenharam sua iconografia, tornando-o quase um sósia de Jesus Cristo, sem faltar a figura do Judas traidor, no caso, Joaquim Silvério dos Reis.
É muito provável que o produto final tenha ficado longe da realidade.
Como militar, era-lhe permitido usar apenas discreto bigode e, na prisão onde ficou 3 anos saindo direto para o cadafalso, os presos eram obrigados a fazer a barba, diariamente.
A DERRAMA
A decadência da mineração no final do século 18 foi provocada pela combinação de falta de recursos técnicos e a extinção dos filões a céu aberto e ao alcance das águas subterrâneas mais superficiais.
Para compensar o prejuízo, as autoridades portuguesas decidiram promover a "Derrama" - cobrança compulsória de impostos atrasados desde 1762, que já tinham chegado à soma de 538 arrobas de ouro.
A conspiração contra o governo português para reverter o quadro de exploração - ocorrida em Minas Gerais na década de 1780 - e que teve seu ponto máximo em maio de 1789, foi um episódio de largo alcance.
O número de envolvidos era enorme. Os "Autos da Devassa da Inconfidência Mineira" - documentos escritos por juristas da Corte Portuguesa - apontam 84 pessoas tidas como principais responsáveis pela Conjuração.
INCONFIDENTE IRLANDÊS
Revoltosos de várias capitanias da Colônia e um cidadão irlandês (Nicolas George Gwerck) se envolveram na trama movidos pelas idéias libertárias de jovens e bem nascidos brasileiros, que haviam estudado na Europa.
Contavam com a promessa de apoio político dos EUA - recém-libertados da Inglaterra - e de suporte militar da França. A bandeira criada reproduzia a frase latina contendo a frase latina "Libertas Quae Sera Tamen (Liberdade ainda que tardia)", mais tarde transposta para a bandeira do Estado de Minas Gerais.
TRÊS TRAIDORES
O governador da capitania de Minas Gerais, Luís Antônio Furtado de Mendonça, Visconde de Barbacena, foi informado da revolta por uma carta datada de março de 1789, assinada pelos portugueses Basílio de Brito Malheiro do Lago e Joaquim Silvério dos Reis - que ficou liberado de enorme dívida com Fazenda Real, recebeu um título de nobreza e uma mansão como moradia - e pelo açoriano Inácio Correia de Pamplona.
A carta delatava que, na noite da insurreição, que coincidiria com a data da Derrama, os líderes sairiam às ruas, dando vivas à República, pois contavam que a população de Vila Rica aprovaria a libertação do jugo português.
O Visconde de Barbacena suspendeu a derrama e ordenou a prisão dos conjurados.
Em maio de 1789, começou o processo onde dezenas de pessoas foram presas interrogadas, torturadas e mortas. Esta tortura durou 3 anos.
UM HERÓI COM MUITO CARÁTER
Tiradentes, que assumiu inteira responsabilidade pela revolta, foi condenado à morte juntamente com outros dez companheiros.
Um deles, por ser mulato, deveria das três voltas em torno da forca, antes da execução.
O bom caráter e estatura moral do Alferes fizeram com que não revelasse nenhum detalhe sobre a conspiração, não comprometesse ninguém - afirmando que não negava mas não se lembrava de nada - e mesmo diante de Silvério dos Reis, não se emocionasse.
Em 18 de janeiro de 1790, depois de sete meses preso, resolve confessar. Nega a culpa de todos e diz que planejou a revolução por motivos pessoais.
A rainha Dona Maria I concedeu clemência a sete réus, que receberam degredo perpétuo, um teve degredo temporário, alguns foram absolvidos e a sentença sobre os padres envolvidos na conjuração permanece em segredo eclesiástico.
Tiradentes foi enforcado no Rio de Janeiro, em frente à Igreja da Lampadosa - nas proximidades da atual igreja da Candelária - na manhã do sábado 21.04.1792.
GLÓRIA AINDA QUE TARDIA
Em 1867, foi erguido em Vila Rica um monumento em sua homenagem.
Proclamada a República, o dia 21 de abril foi declarado feriado nacional, juntamente com o 15 de novembro.
Getúlio Vargas, em 1936 - no final do Estado Novo - exaltou a figura heróica e o Marechal Castelo Branco, com a lei nº 4.897 de 09.12.1965, publicada no Diário da União, de 13.12.1965 fez de Tiradentes o "patrono cívico da Nação Brasileira".
QUEM FOI O ALFERES XAVIER?
Quarto de sete irmãos, Joaquim José da Silva Xavier era filho do português Domingos da Silva Santos e da brasileira Antônia da Encarnação Xavier.
Nasceu em 1746, na fazenda da família, em Santa Rita de Rio Abaixo, entre a Vila de São José (hoje Tiradentes) e São João-del-Rei. Aos 11 anos, órfão de pai, passou a viver com o tio e padrinho, Sebastião Ferreira Leitão, cirurgião e minerador
Foi vendedor ambulante e minerador e tornou-se técnico em reconhecimento de terrenos.
Alistou-se na tropa da capitania de Minas Gerais em 1º de dezembro de 1775, diretamente no posto de Alferes.
Foi nomeado pela Rainha Maria I comandante da patrulha do Caminho Novo, estrada que ligava Minas ao Rio de Janeiro.
Foi nesse momento que o Alferes Xavier (segundo-tenente na hierarquia moderna) começo a refletir sobre a exploração a que a Corte submetia a Colônia e passou a fazer críticas abertas à desigualdade entre o volume das riquezas extraídas pelos portugueses e a pobreza em que vivia nosso povo.
Pediu licença do posto em 1787 e, enquanto articulava e organizava a revolta, começou a trabalhar no Rio de Janeiro, tentando aprovar projetos de canalização das águas dos rios Andaraí e Maracanã, de um trapiche no porto, de armazéns para guardar cargas que ficavam a céu aberto e de uma linha de barcos fazendo a ligação entre o Rio e Niterói, na Praia Grande.
Se a eterna burocracia nacional não tivesse emperrado os projetos pioneiros do Alferes, talvez nossa História fosse outra.
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